quarta-feira, 25 de março de 2009

O Menino Que Queria Voar





Tudo começou na verdade como uma brincadeira de criança; e é assim que geralmente tudo começa na vida da gente; apenas como uma brincadeira! Mas sabe quando a gente percebe que tudo acaba virando coisa séria e não percebe que acabou mergulhando em um mundo de possibilidades e de impossibilidades e, na maioria das vezes, quem está ao nosso lado não percebe isso?
Assistindo os heróis na televisão, lendo suas histórias nos gibis, imaginando suas histórias acontecendo com a gente, dentro da nossa sala de aula ou na cidade onde a gente mora. Claro que esse herói seria nosso amigo íntimo! Aprenderíamos como salvar uma linda garota e ela se apaixonaria pela gente! Também saberíamos os segredos mais pessoais desses heróis; suas fraquezas e suas virtudes. Saberíamos também como ter aqueles poderes absurdamente belos e atraentes!
Quem nunca pensou assim? Talvez tenhamos alguns infelizes que não, mas certamente a grande maioria queria ter sido um grande herói ou talvez até ser um grande vilão; ou mais ainda, um anti-herói. Aqueles que não respeitam regras como os vilões, mas acabam fazendo o bem como os heróis.
De todos os poderes de todos os heróis já vistos e conhecidos, um particularmente chamou atenção de um garoto: o poder de voar. Esse garoto não tinha lá muitas vantagens. Era magro, não chamava atenção pela beleza porque não a tinha como outros meninos de sua turma; tampouco era galanteador, não sabia nem paquerar uma menina direito muito menos convidá-la para sair. Não se vestia na moda nem seguia os padrões de comportamento social. Para ele, o que significava mesmo era o coração de cada um. Nunca se importou com classe social, cor de pele ou se era pedreiro, padeiro ou prefeito. Tudo era a mesma coisa!
Numa tarde, ele estava sozinho em casa quando passava na TV um filme sobre imaginação, aventura e que todos os sonhos, não importando quão divinamente ridículos, impossíveis ou infantis fossem, eles se realizariam. Apenas precisava que acreditasse e eles se tornariam realidade! Pronto, a loucura ingênua da infância tomou seu devido lugar na mente e no coração daquele menino e não saiu mais!
Quando disse que tudo começou numa brincadeira não estava mentindo. Brincando de saber qual seria seu maior desejo caso estivesse diante de um gênio da lâmpada mágica, o menino da nossa história prontamente disse que gostaria de voar. “Para onde?”, alguém perguntou. “Para onde eu quisesse!”, ele respondeu. “Não haveria mais limites para viver ou conhecer. Não haveria mais limites para nada. O dinheiro não seria mais problema a não ser para comer e vestir. Estaria aqui e em outro momento estaria em outro lugar. Poderia levar quem eu quisesse para conhecer os lugares que quisessem sem cobrar nada por isso. Poderia ir e conhecer as pessoas que quisesse na hora que quisesse. Salvaria pessoas nos prédios, nos andaimes, em incêndios e em acidentes. Seria um herói em carne e osso, sem precisar de gibis ou de filmes. Estaria aqui o tempo que fosse e voaria o tempo que fosse”. Esse era o desejo mais íntimo desse garoto em se tratando de voar. Parece até um tanto atrevido esse desejo, quase desejando ser Deus; mas isso nunca passou na cabeça dessa criança. Aliás, essas coisas nunca passam na mente e no coração de criança alguma. Só os adultos “maduros” é que gostam da idéia de controlar, mandar, ditatoriar a vida de outra pessoa.
Não preciso nem dizer que isso foi o suficiente para que o pessoal da mesa fosse ao chão na maior gargalhada e jogando um balde de água fria no discurso inspirado do menino. Aí vieram as explicações que nunca um ser humano poderia voar pelo simples fato que ele não tem asas, nunca houve ninguém que voasse, era impossível, cientificamente impossível, e toda conversa que os mesquinhos de alma são perfeitos em fazer. Mas o menino queria voar; e ele voaria.
Ele voaria quase toda noite quando ele pedisse para o seu Pai do céu que Ele desse uma oportunidade para mais uma vez voar por sobre a cidade e ir de lugar a lugar, tendo a sensação inigualável que é flutuar seu corpo por sobre nuvens e montes sentindo o vento bater em sua face e fazer aquelas manobras que só quem voa entende.
Ele voaria muito mais alto realizando seus sonhos; sonhos estes que muita gente nunca acreditou que se realizassem de fato. Calaram-se diante da verdade de que esse garotinho voava de verdade.
Ele voaria entendendo que na vida nem tudo funciona do jeito que a gente quer. Mas sempre a gente acaba gostando do final da história. Não por causa do resultado, mas por causa do entendimento e de quem sempre está por trás.
Ele voaria entendendo que há gente má nesse mundo. Gente hipócrita, gente aproveitadora, gente que não sabe amar, gente que machuca, gente que não é gente. Mas mesmo essas pessoas são assim porque não sabem como é gostoso voar.
Ele voaria vendo os horrores do mundo e que nem tudo a gente pode consertar. Ainda que seja uma coisa boa, às vezes não dá!
Ele voaria sabendo perder. Perder alguém que precisa ir embora. Precisa alçar vôos mais altos, chegar enfim no lugar onde não há lágrimas, não há dor, não há mais medo nem pânico, não há mais como perder, porque agora é só voar de novo e de novo e de novo.
Ele voaria conhecendo que há Alguém lá no céu que quer ficar bem pertinho da gente aqui na Terra. Esse Alguém sabe de tudo que a gente precisa, e de tudo que a gente sofre, e de tudo que a gente espera ganhar algum dia na esperança de uma vida melhor. Esse vôo esse garoto não esqueceu jamais.
Ele voaria esperando dias melhores. Dias melhores para a mãe que perde a batalha do dia a dia com as drogas que seu filho escolheu. Dias melhores para o pai que sai pra achar emprego e não acha nada, só tapas e portas na cara. Dias melhores para o jovem que vê tudo isso e se encontra de mãos atadas diante de um sistema diabólico de selvageria extrema que insiste em pregar que o melhor é sempre aquele que está no topo, e não aquele que se esforça, e não aquele que é honesto. Dias melhores para o idoso que quer, no mínimo, descansar e curtir os netos sem dor de cabeça porque a aposentadoria está nas mãos de governantes diabólicos e sem escrúpulos.
Ele voaria mais e mais. Ele voaria vivendo e aprendendo. Sabendo que as pessoas não são do jeito que ele queria elas fossem, mas do jeito que Deus quer. Voaria vendo a graça de Deus na música, nos livros, nos filmes e novelas, nas fábulas e nas histórias de ninar. Voaria muito, sem saber onde parar, sem saber se devia parar.
E ele continuou voando. Agora, ele não era mais conhecido como aquele garoto que queria voar. Não, não mais! Agora ele era conhecido como o garoto que sabia voar!

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